A CCJ (Comisso de Constituio e Justia) do Senado aprovou nesta quarta (27) o projeto de lei do chamado marco temporal para a demarcao de terras indgenas, tese derrubada pelo STF (Supremo Tribunal Federal) h menos de uma semana.
O projeto foi aprovado pela Cmara dos Deputados em maio com apoio da bancada ruralista e do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), como parte da ofensiva do Congresso contra o STF.
Nesta quarta, a proposta foi aprovada pela CCJ por 16 votos a 10. O projeto de lei ainda precisa ser aprovado pelo plenrio do Senado.
O relator do projeto no Senado, Marcos Rogrio (PL-RO), manteve o texto aprovado pela Cmara dos Deputados e rejeitou todas as sugestes de mudana. Ele defendeu que os pontos que extrapolam a tese —como o contato com povos isolados— sejam vetados pelo presidente Lula (PT).
"Se ns fizermos qualquer modificao substancial aqui, essa matria volta para a Cmara. E a uma escolha poltica. E ns estamos diante de um ambiente de insegurana, inquietao, intranquilidade no Brasil inteiro", justificou.
Nas ltimas semanas, senadores contrrios ao marco temporal reconheciam que seria difcil barrar a aprovao do texto em um momento em que o Senado tenta enfrentar discusses em curso no STF no s sobre este tema, mas tambm em relao a drogas, aborto e imposto sindical.
Nesta tera (26), o lder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), disse que a discusso foi contaminada por ideologias, e no quis arriscar o resultado do plenrio. "Eu no sei aferir essa coisa [no plenrio] porque essa discusso virou muito ideologizada", disse a jornalistas.
Reservadamente, integrantes da base do governo afirmam que, em caso de aprovao, Lula deve enxugar o projeto de lei —eliminando os chamados "jabutis"— e preservar apenas o trecho que estabelece o marco temporal.
Na sesso desta quarta, Jaques disse que Lula "far o que a sua conscincia disser". O senador tambm afirmou que "no tem dinheiro suficiente" para uma possvel indenizao da Unio a produtores rurais que adquiriram terras indgenas regularmente.
"No tem dinheiro suficiente para pagar indenizao com a crise fiscal da qual ns sonhamos em sair. Vai virar tudo precatrio? Vai virar tudo o qu? No sei. Eu s estou querendo chamar ateno que ns no estamos no caminho da soluo."
O relatrio foi lido por Rogrio na semana ada —horas antes da retomada do julgamento pelo STF. Em agosto, o projeto de lei foi aprovado pela Comisso de Agricultura do Senado por 13 votos a 3, com parecer favorvel da relatora, Soraya Thronicke (Podemos-MS).
" aqui que se decide, no no Supremo", disse o senador Weverton Rocha (PDT-MA), que presidia a CCJ na ocasio. "Se fizermos certo na prtica legislativa, isso aqui est resolvido e no tem que se levar para l [STF] o nosso debate."
A tese do marco temporal determina que as terras indgenas devem se restringir rea ocupada pelos povos na promulgao da Constituio, em 5 de outubro de 1988. Assim, indgenas que no estavam em suas terras at a data no teriam direito de reivindic-las.
Na quinta (21), a tese foi declarada inconstitucional pelo Supremo por 9 votos a 2. Movimentos indgenas argumentam que, em 1988, seus territrios j haviam sido alvo de sculos de violncia e destruio, e que as reas de direito dos povos no deveriam ser definidas apenas por uma data.
Por outro lado, ruralistas defendem que tal determinao serviria para resolver disputas por terra e dar segurana jurdica e econmica. A posio foi endossada no STF pelos ministros Kassio Nunes Marques e Andr Mendona.
At mesmo senadores a favor do projeto de lei reconhecem que o texto aprovado na CCJ vai alm da tese. Um dos artigos d aval para o contato com povos isolados para "prestar auxlio mdico ou para intermediar ao estatal de utilidade pblica".
Em outro ponto polmico, a proposta abre brecha para que terras demarcadas sejam retomadas pela Unio, "em razo da alterao dos traos culturais da comunidade ou por outros fatores ocasionados pelo decurso do tempo".
O texto tambm possibilita a indenizao ao antigo proprietrio de terras demarcadas (que no ocorre hoje), veda a ampliao de territrios j delimitados e diz que mesmo os processos em andamento devem considerar a rea ocupada em 1988.